O uso e o convívio com a mídia digital são inegáveis nos dias de hoje. O isolamento imposto pela pandemia da Covid-19 acelerou a latente massificação desta incrível ferramenta de propagação de ideias e de vendas.

A mídia digital é representada por diferentes modalidades de conteúdos em sites, blogs e redes sociais. Dentre as redes sociais, temos como principais exemplos o Instagram, o Facebook e o YouTube, que são extensamente usados com a finalidade de divulgação de organização empresarial, marketing e educação. No Brasil, o investimento em mídia digital aumentou 25% somente no primeiro semestre de 2021¹ .

Este crescente investimento indica o cuidado que devemos ter em relação a tudo o que circula em nome da ciência ortodôntica. As mídias digitais facilitam a comunicação entre os profissionais, inclusive proporcionam maior acesso de estudantes aos docentes e pesquisadores de diferentes partes do mundo. Hoje, temos inúmeras formas de enviar mensagens para autores de artigos científicos, bem como os autores de pesquisas podem divulgar seus achados nas mídias sociais para que o benefício deste trabalho chegue a um maior número de pessoas. Contudo, não há somente o lado positivo nestas novas modalidades de comunicação.

A pós-verdade também tem dado seus sinais na Ortodontia. Verifica-se a ocorrência da pós-verdade ortodôntica, principalmente, em postagens do Instagram e do Facebook. De modo preocupante, observa-se a venda de cursos propagando métodos de tratamento nos quais o importante é a verdade individual do autor, uma verdade que desmente o fato comprovado. Inacreditável! Fomos formados com ênfase no diagnóstico e agora surgem métodos que não analisam nada; são apenas frutos de opinião, seja ela qual for e de qualquer maneira.

Existe o temor de que parte de uma geração de ortodontistas seja influenciada pelo bombardeio de informações geradas pelos “papagaios digitais”, que têm se apropriado de conteúdos e os divulgam como se fossem donos dessas ideias. Uma verdadeira manifestação de plágio associada à distorção de fatos e métodos de tratamento. Verifica-se que há uma cadeia de ações orquestradas para gerar confiabilidade. Um pacote formado pela compra de seguidores, acordos para o recebimento de recíprocos aplausos e perfis fakes que impulsionam postagens. Toda esta estratégia faz os menos experientes crerem em inverdades ou técnicas produzidas até mesmo por empresas de vendas. Estas companhias fazem com que pretensos influenciadores digitais da Ortodontia acreditem que estão produzindo conteúdo relevante.

Há tempos, o escritor Umberto Eco chamou atenção de que a internet trouxe a democracia da informação, mas também deu voz aos imbecis de todo o mundo. Criar conteúdo para as áreas de política, educação e saúde é algo que exige tempo e profundo conhecimento. A qualidade é de extrema importância, portanto demanda tempo e responsabilidade. Seremos julgados pelos tratamentos realizados durante dez, 20, 30 anos. Assim, seu perfil na mídia digital será a sua representação ao longo de sua carreira. É essencial se perguntar: como o conteúdo que estou postando hoje irá influenciar minha carreira ao longo dos anos?

As pessoas precisam ter noção de responsabilidade sobre o que propagam e consomem na internet – e neste ponto os cursos de especialização e as universidades precisam ter papel de formação. Precisamos alertar os alunos para terem cuidado com as informações e navegarem de forma consciente. Caso contrário, os profissionais serão mais propensos a ignorar informações que confirmam uma ideia com a qual não concordam, mostrando um desprezo pela verdade, ainda que baseada em fatos. Corremos o sério risco de sermos sucedidos por uma geração de ortodontistas com desprezo e desapego às associações de classe e aos tradicionais eventos científicos, que atualmente são fontes importantes de variadas linhas de pensamento.

As associações e os periódicos científicos ainda são os melhores espaços para a divulgação de ideias de diferentes filosofias, bem como os congressos representam o momento oportuno para network e apresentação dos discursos polifônicos – sempre baseados em Ciência e julgamento por pares.

A defesa pela propagação da informação ortodôntica de qualidade deve ser exercida por meio da orientação durante a formação do profissional. O valor pelo conteúdo digital de qualidade, com respeito ao diagnóstico e à Ciência, deve ser o pilar para a propagação com responsabilidade de uma mídia digital apropriada e coerente.