Desenvolvimento craniofacial: o processo mostra ser de suma importância para o diagnóstico, o prognóstico e a planificação do tratamento ortodôntico.
O processo de crescimento e desenvolvimento craniofacial é de suma importância para o diagnóstico, o prognóstico e a planificação do tratamento ortodôntico. Seu entendimento facilita o reconhecimento dos desvios da normalidade, possibilitando a atuação precisa do ortodontista na época mais oportuna de intervenção. No período de crescimento, diferenças entre maxila e mandíbula e entre os genêros masculino e feminino devem ser reconhecidas e consideradas durante a planificação do tratamento.
Isso porque a maxila e a mandíbula apresentam comportamentos distintos nas fases do crescimento. A maxila atinge o máximo de velocidade de crescimento na segunda infância, acompanhando o crescimento neural, enquanto a mandíbula apresenta maior potencial de crescimento no período puberal, seguindo a curva do crescimento geral. Assim, o conhecimento do processo de crescimento e desenvolvimento craniofacial possibilita ao ortodontista ter o crescimento como seu aliado e considerá-lo nos planejamentos dos casos. Além disso, o padrão dos crescimentos maxilar e mandibular auxilia na explicação de que nem todos os casos devem ser tratados apenas quando o paciente já tem todos os dentes permanentes irrompidos, como muitos pais acreditam. Facilita também o esclarecimento sobre o tempo de tratamento que a má-oclusão com discrepância esquelética requer e a importância do acompanhamento e da colaboração até que o crescimento esteja finalizado, principalmente na má-oclusão de classe III. As alterações no sentido anteroposterior, quando diagnosticadas precocemente, podem ser tratadas com aparelhos ortopédicos que atuam alterando a direção do crescimento em uma tentativa de obter relações ósseas mais harmoniosas.
As meninas cessam o crescimento mais precocemente que os meninos e, portanto, o conhecimento desse processo também auxilia no entendimento do porquê as meninas devem ser tratadas mais precocemente do que os meninos, facilitando a compreensão dos pais de que possivelmente uma filha com idade inferior deverá ser tratada antes de um filho que é mais velho.
Também é valioso o seu emprego no esclarecimento inicial aos pais e pacientes em relação ao prognóstico, às expectativas de tratamento e à motivação na cooperação do uso dos aparelhos indicados.
Informações relevantes para o prognóstico e para a planificação do tratamento também são obtidas por meio do conhecimento do processo de crescimento craniofacial. De acordo com o Atlas de Crescimento Craniofacial, ao analisar o eixo de crescimento dos seis anos aos 18 anos de idade, observa-se pouca alteração angular (medidas PoOr.SGn e BaN.FPTMI Gn), demostrando que o padrão facial permanece praticamente estável, ou seja, não há alteração do padrão inicial de crescimento (Quadro 1). Um aparelho ortopédico corretamente indicado é capaz de interferir no vetor de crescimento, harmonizando as estruturas faciais.
Verifica-se também durante o crescimento uma diminuição progressiva nas medidas SN.GoGn, PoOr.GoGn, FMA e Ar.Go.Me (Quadro 1) que representam a interpretação do padrão de crescimento facial. Estas variações ocorrem naturalmente com o evolver da idade, entretanto, ressalta-se que os programas computadorizados não fazem essas distinções, pois são programados somente valores para adultos, sem se aterem às características específicas para cada idade e sexo. Entretanto, observa-se que o crescimento em altura do ramo mandibular (Co-Go) exerce influência na interpretação dessas medidas conforme a idade estudada. O crescimento vertical do ramo mandibular, onde está demarcado o ponto Go, presente nestas medidas, provoca uma rotação mandibular no sentido anti-horário, resultando na diminuição progressiva das medidas angulares. Sendo assim, torna-se de fundamental importância reconhecer essa influência, principalmente na seleção da intervenção ortodôntica/ortopédica nos pacientes mais jovens, a fim de não classificar erroneamente um paciente como padrão vertical quando na realidade ele apresenta valores normais para aquela idade avaliada.
Alterações no ângulo formado entre o ramo e o corpo mandibular podem ser percebidas também pela variável ângulo do ramo mandibular (Ar.Go.Me), que revela o grau de fechamento desse ângulo no período analisado, principalmente devido à movimentação para baixo do ponto Go, resultante do crescimento na altura do ramo mandibular nessa região (Co-Go), com consequente tendência ao paralelismo entre as medidas que avaliam os planos horizontais (Quadro 1).
A importância do conhecimento do que ocorre nesta região tem também implicações diretas na classificação do padrão da altura facial total posterior (AFTP) e do tipo de crescimento facial que está ocorrendo. Um exemplo: qual a sua interpretação cefalométrica para uma medida SN.GoGn de 36°? Deve-se atentar que uma criança aos seis anos de idade não representa um padrão de crescimento vertical, pois ainda ocorrerão alterações durante o processo de crescimento. Se não considerarmos as alterações que ocorrem normalmente nesta medição, podemos interpretar erroneamente e instituirmos tratamentos inadequados. Um paciente com predomínio inicial de crescimento vertical não terá uma modificação ortopédica tão profunda que possa transformá-lo em padrão normal, mas o conhecimento do que ocorre naturalmente durante o período ativo de crescimento pode ser explorado na busca para minimizar as consequências indesejadas. Para um paciente com padrão predominantemente braquifacial, podemos antecipar as dificuldades para a correção do trespasse vertical acentuado e planificar uma sobrecorreção da má-oclusão.
A avaliação do comportamento da altura facial anteroinferior (Afai) informa o grau de desenvolvimento do terço inferior da face e sua influência na proporção da aparência facial. Auxilia também na seleção de aparelhos que visam promover aumentos ou diminuições neste terço facial, além de orientar os cirurgiões ortognáticos em suas previsões de interferências. Do ponto de vista cefalométrico, é notória a influência dessa medida na composição dos perfis ósseo e tegumentar. Muitos pacientes são beneficiados com o aumento ou a diminuição da Afai, “disfarçando/compensando” problemas no comprimento das bases ósseas.
Por exemplo, é relativamente comum encontrarmos um paciente com aparência retrognática, com medida do comprimento efetivo da mandíbula (Co-Gn) maior do que determina a tabela de proporções de McNamara Jr. A justificativa para tal aparência pode ser atribuída a uma medida de Afai aumentada, que promove rotação mandibular no sentido horário. Inversamente, naqueles com uma medida Co-Gn encurtada, é favorável uma medida menor para o Afai, pois essa rotação mandibular no sentido anti-horário favorece a camuflagem do problema esquelético.
Entre as áreas de atuação do ortodontista, encontram-se os dentes e os processos alveolares. Em muitos casos, o objetivo do tratamento é harmonizá-los na busca da “aparência de normalidade” entre as bases ósseas e alveolares, realizando compensações dentárias. O período que compreende grandes modificações dentárias inicia-se em torno dos seis anos, quando instala-se a dentadura mista (primeiro período transitório de Vander Linden), no processo de substituição dos dentes decíduos pelos permanentes.
É importante o conhecimento deste movimento para não indicar erroneamente aparelhos com a finalidade de corrigir as inclinações axiais, que a própria natureza realizará sozinha.
O conhecimento dos movimentos normais de erupção dos incisivos e dos molares também é relevante para o estabelecimento do diagnóstico e para a planificação do tratamento. As alterações nas medidas dentárias (1sup.NA, 1 sup.PoOr e 1sup-NA) representam a movimentação angular e linear que os incisivos superiores executam dentro da maxila, para frente e para baixo, principalmente entre os seis e os oito anos de idade, seguindo dos 12 anos até os 18 anos com poucas alterações (Quadro 1). Durante o processo de crescimento, os incisivos inferiores realizam movimentos de inclinação para vestibular (1inf.NB, IMPA, FMIA) e protrusão (1inf-NB), sendo também mais expressivos entre os seis e oito anos de idade (Quadro 1). O fechamento do ângulo interincisivo é observado como o resultado final dessas alterações que auxiliam na obtenção de espaço nos arcos para os dentes permanentes.
Os movimentos de erupção e flutuação exercidos pelos molares desde a sua erupção até atingir a linha de oclusão e depois o movimento de compensação (flutuação), com o crescimento vertical alveolar durante o período de crescimento, encontram-se expressos pelas medidas CMS (distância entre a cúspide mesial do molar superior perpendicular ao plano palatino ENA-ENP) e CMI (distância da cúspide mesial do molar inferior perpendicular ao plano mandibular GoMe) no Quadro 1. A erupção do primeiro molar inicia por volta dos seis anos de idade e finaliza quando atinge a oclusão com seu antagonista, por volta dos oito a nove anos de idade. Com o aumento da distância vertical entre as bases esqueléticas (maxila e mandíbula), oriunda do aumento dos processos alveolares, os molares “flutuam” mantendo a relação oclusal constante durante todo o crescimento vertical dos ossos superior e inferior.
A medida III-MMI demonstra o comportamento entre a distância dos incisivos aos primeiros molares inferiores e deve ser entendida como resultante dos movimentos horizontais realizados tanto pelos molares como daqueles que ocorrem com os incisivos (Quadro 1). O aumento entre os períodos de seis e oito anos deve-se à vestibularização dos incisivos inferiores durante as suas erupções, ainda na presença dos caninos, primeiros e segundos molares decíduos, resultando em um aumento temporário do comprimento de arco. A diminuição da medida linear entre os oito anos e 18 anos de idade ocorre devido à posterior mesialização dos molares inferiores permanentes decorrente do leeway space, quando se completa a dentadura permanente.
Na fase final de dentadura decídua e em toda a dentadura mista, os valores obtidos nas telerradiografias dos pacientes, ao serem confrontados com aqueles da normalidade, podem ser agentes sinalizadores da necessidade de interceptação e correção dos hábitos deletérios, que modificam a arquitetura óssea. Se não forem precocemente abordados, implicam futuramente em intervenções mais complexas, caso nada seja realizado na idade com potencial de autocorreção.
A correção da mordida aberta diagnosticada precocemente, recebendo o devido tratamento interceptor, é facilitada pelo potencial natural do crescimento dos alvéolos e dos dentes, muitas vezes evitando que se torne futuramente uma mordida aberta esquelética, que demande tratamentos mais complexos.
Uma mordida cruzada, quando não corrigida na fase de crescimento maxilar, interfere no desenvolvimento normal deste osso, visto que o crescimento mandibular é mais tardio, ocorrendo predominantemente depois do crescimento maxilar. A correção desta má-oclusão, em idade apropriada, propicia que o crescimento da maxila seja “destravado”, permitindo seu desenvolvimento normal (Figuras 1).
O clínico deve estar atento às modificações relacionadas ao crescimento para decidir entre intervir precocemente ou simplesmente acompanhar os estágios deste processo. Além disto, durante a planificação do tratamento, o profissional pode optar por fazê-lo coincidir com os períodos mais favoráveis de crescimento.
É importante que o ortodontista tenha conhecimento do crescimento e realize supervisões periódicas destes eventos para interceptar desvios da normalidade que, se não tratados em idade oportuna, poderão evoluir para discrepâncias esqueléticas mais severas.
Ressalta-se que nos diferentes grupos étnicos os fenômenos ocorrem similarmente, com pequenas diferenças em relação à magnitude, tornando-se necessária adequações nas interpretações destas medidas para outros grupos raciais.
Caso clínico classe I
Paciente do gênero masculino se apresentou aos oito anos e dois meses para tratamento com queixa principal relacionada à mordida cruzada posterior. Após o exame clínico, observou-se relação anteroposterior interarcos de classe I, presença de mordida cruzada posterior e mordida aberta anterior (Figuras 1A a 1C). O perfil apresentava-se suavemente convexo, porém dentro da normalidade para a idade do paciente. Como o paciente se encontrava em idade ideal para o terapia interceptora, o tratamento foi planificado com a realização da disjunção da maxila e o uso de esporões por lingual dos dentes anteriores nos arcos superior e inferior. Após a disjunção e o período de contenção, o paciente continuou utilizando os esporões por oito meses, totalizando um ano de tratamento. Observa-se no controle de um ano pós-tratamento uma adequada oclusão (Figuras 1D a 1F). A interceptação da mordida cruzada na fase de crescimento maxilar possibilitou o “destravamento” desta base óssea, possibilitando um desenvolvimento normal que culminou com a adequação de espaço para os dentes permanentes. A correção da mordida aberta anterior, por ter sido realizada na fase ativa do crescimento e desenvolvimento alveolar, também foi corrigida de forma eficaz.
Atlas de Crescimento Craniofacial
Em 1998, Martins e colaboradores publicaram o Atlas de Crescimento Craniofacial. Os dados deste estudo longitudinal prospectivo foram coletados em 256 indivíduos portadores de boa oclusão, dos seis anos aos 18 anos de idade, de ambos os gêneros, pelos pesquisadores do Departamento de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP), com a finalidade de demonstrar o processo de crescimento e desenvolvimento craniofacial.
Nas telerradiografias, foram medidas 194 variáveis, obtidas a partir de 45 pontos cefalométricos, resultando em 62.856 medidas masculinas e 60.334 femininas, que receberam tratamento estatístico quanto ao dimorfismo sexual, pareando cada idade. Por meio das medidas é possível verificar os incrementos médios normais que ocorrem nas diferentes idades ou mesmo no período a ser avaliado. Dependendo da idade inicial do paciente, ao localizá-la nesses gráficos, sabe-se a quantidade média de crescimento já ocorrido, que está ocorrendo ou que ainda irá se manifestar, facilitando o prognóstico e a planificação do tratamento. Os resultados, anualizados, demonstram as diferenças entre os gêneros na mesma idade, perceptíveis numérica e graficamente, reforçando a precocidade nas meninas.
No ano de 2006, Pinzan e colaboradores lançaram o livro-texto do Atlas de Crescimento Craniofacial com o intuito de explicar e quantificar detalhadamente o crescimento craniofacial, auxiliando na interpretação das tabelas apresentadas.
Com o intuito de ilustrar o processo de crescimento e desenvolvimento craniofacial, os traçados cefalométricos obtidos a partir de telerradiografias de dois indivíduos (sendo um do gênero masculino e outro do feminino) com oclusão normal, e que compuseram a amostra avaliada para os dados descritos no Atlas de Crescimento Craniofacial, foram sobrepostos (sobreposições na linha S-N, centrado no ponto S) nas fases seis (T1), nove (T2), 12 (T3) e 18 (T4) anos de idade (Figuras 2 e 3).
As sobreposições elucidam as direções do crescimento nos planos vertical e horizontal. Observa-se por meio das imagens o crescimento para baixo e para frente tanto para o gênero masculino como para o feminino, sendo que no feminino as alterações são verificadas mais precocemente.
Observa-se também a diminuição da convexidade do perfil facial com o passar dos anos. É normal a criança apresentar um perfil convexo e suave retrusão mandibular, pois nesta fase há maior crescimento do complexo nasomaxilar para frente e para baixo. Após a maior parte do crescimento maxilar ter sido expressada, verifica-se um aumento da velocidade de crescimento da mandíbula, com consequente diminuição da convexidade do perfil característico da infância. Observa-se também a movimentação em direção à vestibular dos incisivos superiores e inferiores.
As sobreposições elucidam as direções do crescimento nos planos vertical e horizontal. Observa-se por meio das imagens o crescimento para baixo e para frente tanto para o gênero masculino como para o feminino, sendo que no feminino as alterações são verificadas mais precocemente.
Observa-se também a diminuição da convexidade do perfil facial com o passar dos anos. É normal a criança apresentar um perfil convexo e suave retrusão mandibular, pois nesta fase há maior crescimento do complexo nasomaxilar para frente e para baixo. Após a maior parte do crescimento maxilar ter sido expressada, verifica-se um aumento da velocidade de crescimento da mandíbula, com consequente diminuição da convexidade do perfil característico da infância. Observa-se também a movimentação em direção à vestibular dos incisivos superiores e inferiores.
Alterações na maxila
O crescimento horizontal da maxila em milímetros é maior, numericamente, para o gênero masculino, como demonstram as medidas entre as espinhas nasais posterior e anterior (ENP-ENA) e a medida Co-A (Quadro 1).
Essa medida retrata o alongamento da maxila em profundidade para acomodar os dentes permanentes, permitindo avaliar e ajudar nas explicações dos apinhamentos dentários, atribuídos à falta de crescimento desse osso.
Apesar da maxila crescer no sentido anteroposterior, as medidas angulares SNA e NA.PoOr não se mostram matematicamente sensíveis para demonstrar o crescimento para anterior da maxila entre os períodos observados (Quadro 1). A clássica medida angular SNA, que graficamente recebeu intervalos de 0,5º no Atlas de Crescimento de Martins e colaboradores, nos diz que no gênero masculino ela se mantém praticamente a mesma, quando comparados os valores iniciais e finais dos seis anos aos 18 anos. No gênero feminino, observa-se uma diminuição de aproximadamente 1º.
A constância na angulação inicial dessas medidas pode ser explicada ao se observar as medidas S-N e Ba-N e Ba-S que revelam o aumento para anterior na região da base do crânio pelo somatório de crescimento dos ossos que a compõem (occipital, esfenoide e etmoide), que fazem movimentos de deslizamento, promovendo os deslocamentos primário e secundário. Esses movimentos resultam em um deslocamento para anterior do osso frontal. Dessa forma, esses incrementos mantêm o relacionamento da maxila com a base do crânio “aparentemente estável” nos períodos observados. Deve-se também considerar que a demarcação do ponto A aos seis anos é influenciada pela posição intraóssea dos incisivos permanentes superiores por trás dos dentes decíduos, que demandam, assim, maior quantidade de osso nesta região, sendo esta área remodelada ao final do processo eruptivo dos incisivos permanentes.
O tratamento da classe II resultante da protrusão maxilar apresenta melhores resultados quando os aparelhos que controlam o crescimento maxilar são indicados na época de maior potencial de crescimento da maxila (Figuras 4). O mesmo ocorre para a classe III com envolvimento maxilar (Figuras 5).
Caso clínico classe II
A paciente apresentou-se aos nove anos e um mês para tratamento com queixa principal relacionada à mordida aberta anterior. Após o exame clínico, observou-se relação anteroposterior interarcos de classe II, presença de mordida aberta anterior e protrusão dos incisivos superiores com aumento do trespasse horizontal. O perfil apresentava-se convexo, com protrusão maxilar confirmada na telerradiografia.
Visto que a maxila atinge o máximo de velocidade de crescimento na segunda infância, optou-se por realizar o tratamento utilizando um aparelho do tipo splint maxilar com grade palatina, com a finalidade de restringir e/ou interferir no o crescimento anterior da maxila e corrigir as inclinações dos dentes superiores anteriores e a mordida aberta anterior. A paciente utilizou durante 11 meses o aparelho e depois por mais três meses como contenção. Os resultados demonstram a harmonização da oclusão, possibilitando o desenvolvimento normal da oclusão (Figuras 4).
Caso clínico classe III
Aos oito anos e 11 meses de idade, a paciente foi encaminhada pelo clínico geral devido à mordida de topo na região anterior. O exame clínico revelou relação anteroposterior interarcos de classe III, com mordida de topo entre os incisivos do lado direito e mordida aberta anterior. O perfil apresentava-se suavemente côncavo, com ausência da proeminência zigomática. Na telerradiografia, observou-se a retrusão maxilar. Devido à idade propícia para o tratamento interceptor, foi planejada a disjunção da maxila, utilização de esporões nas faces linguais dos incisivos superiores e inferiores e uso da máscara facial. Após sete meses de terapia, verificou-se a correção das alterações oclusais. Como o crescimento mandibular ainda ocorreria, planificou-se o uso do aparelho progênico e mentoneira noturna com a finalidade de manter a correção obtida (Figuras 5).
Alterações na mandíbula
A visualização do crescimento para anterior da mandíbula em relação à base do crânio é evidente e sensível quando se observa as medidas SNB e NB.PoOr (Quadro 1). Estas medidas refletem o movimento para anterior que a mandíbula descreve durante o crescimento ativo, aprimorando o relacionamento anteroposterior com a maxila. O comportamento, principalmente pelo crescimento para anterior da mandíbula, resulta em uma diminuição da convexidade facial com diminuição das variáveis ANB e diferença maxilomandibular (Co-A – Co-Gn), Quadro 1. O Atlas de Crescimento Craniofacial sugere médias angulares e lineares desse movimento, auxiliando o clínico no diagnóstico da má-oclusão a ser tratada e possibilitando melhor abordagem terapêutica.
Além disso, permite que o profissional demonstre aos pais ou responsáveis a importância do uso dos aparelhos para o melhor aproveitamento dos fenômenos de crescimento, ou mesmo prever um resultado menos favorável devido à idade inicial do tratamento.
O crescimento em altura do ramo mandibular é quantitativamente maior do que o do seu corpo, como pode ser observado analisando-se as medidas Go-Me, Co-Gn, Go-Gn e Co-Go (Quadro 1). Destaca-se que o Atlas de Crescimento fornece medidas até os 18 anos de idade, e os meninos ainda progridem no seu crescimento, revelando curvas ainda ascendentes. Entre as idades de 12 e 18 anos, nota-se que as meninas têm um surto de crescimento residual mais curto, comparativamente aos meninos. Ao analisar a medida Go-Gn, constata-se que o crescimento horizontal do corpo mandibular demonstra um término mais precoce nas meninas e uma tendência progressiva nos meninos, podendo comprometer, por exemplo, a finalização dos casos de pacientes portadores de classe III.
O tratamento da deficiência mandibular com aparelhos ortopédicos funcionais deve ser realizado preferencialmente, na fase de maior potencial de crescimento da mandíbula, que seria na puberdade. Em estágios prévios, verifica-se melhora, entretanto, com resultados inferiores em relação à magnitude das alterações. O mesmo ocorre após o surto, quando é observada maior quantidade de compensação dentária. Os maiores efeitos dos aparelhos ortopédicos funcionais acontecem quando o pico de crescimento mandibular está incluído no período de tratamento.
QUADRO 1 – VARIÁVEIS CEFALOMÉTRICAS PARA OS GÊNEROS MASCULINO E FEMININO E EM DIFERENTES IDADES
Referências
1. Pinzan A, Garib DG, Martins DR, Janson G, Henriques JFC, Freitas MR et al. Crescimento e desenvolvimento craniofacial. In: Abrão J, Moro A, Horliana RF, Shimizu RH. Ortodontia Preventiva Diagnóstico e tratamento. (1a ed.). São Paulo: Artes Médicas; 2014. p.9-1.
2. Gonçalves RC, Santos-Pinto AS, Raveli DB, Gandini Jr. LG, Martins LP. Manejo Ortodôntico da má-oclusão de Classe II: da Teoria à Prática. (1a ed.). Ribeirão Preto: Tota, 2015. p.500.
3. Janson G, Garib DG, Pinzan A, Henriques JFC, Freitas MR. Introdução à Ortodontia. (1a ed.). São Paulo: Artes Médicas; 2013. p.160.
4. Martins DR, Janson GRP, Almeida RR, Pinzan A, Henriques JFC, Freitas MR. Atlas de Crescimento Craniofacial. (1a ed.). São Paulo: Santos; 1998. p.280.
5. Pinzan A, Pinzan-Vercelino CRM, Martins DR, Janson GRP, Henriques JFC, Freitas MR et al. Livro-texto do Atlas de crescimento craniofacial. (1a ed.). São Paulo: Santos; 2006. p.88.
6. Pinzan A, Pinzan-Vercelino CRM, Pieri LV. Application of craniofacial growth concepts in orthodontic clinic. In: Enlow DH, Pieri LV. Craniofacial growth, orthodontics and dentofacial orthopedics: a tribute to Donald Hugh Enlow. (1a ed.). Franca: The Donald Hugh Enlow Center; 2019. p.357-70.
7. Vellini-Ferreira F. Crescimento e desenvolvimento craniofacial. In: Vellini-Ferreira F. Ortodontia: Diagnóstico e Planejamento Clínico. (7a ed.). São Paulo: Artes Médicas; 2008. p.31-55.
Coordenação:
Alexander Macedo
Especialista e mestre em Ortodontia – Universidade Cidade de São Paulo (Unicid); Professor do curso de especialização em Ortodontia do Instituto Vellini.
Autores convidados:
Arnaldo Pinzan
Professor associado III do Depto. de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva – Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP).
Orcid: 0000-0002-7195-5299.
Maria Pia Seminário Yarlequé
Doutoranda do Depto. de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva – Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP).
Orcid: 0000-0001-7626-756X.
Célia Regina Maio Pinzan-Vercelino
Professora do Depto. de Ortodontia – Universidade Ceuma (São Luís/MA); Mestra, doutora e pós-doutorado – Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP).
Orcid: 0000-0002-5419-0079.
José Gregório Pelayo Guerra
Doutorando do Depto. de Odontopediatria, Ortodontia e Saúde Coletiva – Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB/USP).
Orcid: 0000-0001-8724-3731.