DATs extra-alveolares no processo zigomático da maxila com o método Sniper

DATs extra-alveolares no processo zigomático da maxila com o método Sniper

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Mauricio Cardoso e Sérgio Cury destacam que o processo zigomático da maxila é uma área extra-alveolar confiável e segura para a instalação de mini-implantes. 

A ancoragem extra-alveolar com os mini-implantes tem representado um grande avanço na mecânica ortodôntica, uma vez que permite movimentos antes impossíveis, como a distalização e mesialização completa de todo o arco, seja maxilar ou mandibular. Outra vantagem dessas áreas extra-alveolares é a maior densidade óssea disponível, com maior volume de osso cortical, quando comparadas às áreas inter-radiculares, conferindo ao mini-implante maior estabilidade primária1-2.

No arco superior, uma área extra-alveolar amplamente utilizada é a crista infrazigomática ou IZC (infra-zygomatic crest), proeminência óssea localizada por vestibular em relação às raízes dos molares, logo abaixo do processo zigomático da maxila³ . Apesar da simplicidade biomecânica possibilitada por tal ponto de ancoragem, essa área possui particularidades anatômicas importantes que devem ser consideradas, pois dificultam o correto posicionamento do mini-implante, como o pouco espaço disponível por vestibular das raízes dos molares e a sua proximidade do seio maxilar4.

Devido às limitações mecânicas relacionadas à ausência de espaço para a instalação adequada de mini-implantes em IZC, uma alternativa viável e mais segura, nesses casos, é a instalação de mini-implantes diretamente no processo zigomático da maxila (Figuras 1). É importante entender as diferenças entre essas duas áreas de instalação, uma vez que tanto a seleção do mini-implante como a técnica de instalação apresentam divergências.

Figuras 1 – A. Diferença anatômica da crista infrazigomática para a área do processo zigomático da maxila. B. Mini-implantes extra-alveolares instalados em crista infrazigomática e processo zigomático da maxila.


Estabilidade secundária e a mucosa alveolar

A estabilidade secundária ou biológica é de extrema importância para a manutenção do posicionamento do mini-implante no decorrer do tempo, pois o fator tido como mais frequente para a sua perda é a inflamação ou infecção da área peri-implantar5-6. Apesar da gengiva inserida, ceratinizada, oferecer maior proteção peri-implantar e, consequentemente, maior estabilidade secundária7, a área do processo zigomático da maxila encontra-se sempre em mucosa alveolar, requerendo alguns cuidados para evitar intercorrências após a instalação do mini-implante:

A) O mini-implante não deve estar inclinado ou demasiadamente deslocado em direção à bochecha, pois pode causar aftas e ulcerações6 importantes. Por essa razão, muitas vezes precisa ser removido;

B) Deve-se manter um comprimento mínimo de 5 mm de mini-implante para fora da mucosa (incluindo a cabeça), para prevenir um possível recobrimento da mucosa alveolar².

Seleção do mini-implante

Diferentemente do comprimento adotado para a crista infrazigomática, que varia entre 12 e 14 mm, no processo zigomático da maxila deve-se utilizar um mini-implante mais longo, uma vez que o ponto de instalação é mais distante, requerendo um comprimento de 16 mm a 18 mm. Quanto maior for o diâmetro, maior será a estabilidade primária8-11 e, por estar distante das raízes dentárias, é seguro utilizar mini-implantes mais calibrosos, não menores do que 2 mm, uma vez que o maior comprimento do mini-implante aumenta o risco de fratura se ele tiver diâmetro menor.

Do ponto de vista da estabilidade secundária, a extensão do transmucoso do mini-implante é um fator importante, necessitando ser maior do que 6 mm (não menor do que isso) para que ele ocupe a transição da mucosa para a cavidade oral, o que confere melhor proteção à área peri-implantar12. No que diz respeito ao material, os trabalhos demonstram que não existe diferença entre os mini-implantes de titânio ou aço2.13.

Técnica de instalação

A grande extensão de mucosa alveolar, a superfície cortical escorregadia da região e a proximidade do seio maxilar no processo zigomático da maxila são fatores que tendem a dificultar a instalação do mini-implante, exigindo uma técnica criteriosa, diferente da executada na crista infrazigomática. É possível executar a instalação com segurança, seguindo-se quatro passos:

  1. Descorticalização prévia: inicialmente, deve-se realizar 1 mm de perfuração da cortical com lança manual, perpendicular ao processo zigomático da maxila, ou seja, na posição mais vertical possível (Figura 2A). Durante esse processo, o movimento rotacional da chave manual deve ser de “vai e vem”, e não apenas em um único sentido.
    Figuras 2 – A. Descorticalização com lança manual, seguindo movimentos rotacionais de “vai e vem”. B. Movimentos de báscula com o objetivo de aumentar o diâmetro do orifício na cortical. C. Inserção do mini-implante sem alterar a inclinação.
  2. O movimento de báscula: ainda sem remover a ponta da lança do orifício criado na cortical, indica-se realizar um movimento de báscula na chave manual (Figura 2B), criando um aumento de diâmetro do orifício na cortical, sem aprofundá-lo mais. Isso facilitará o próximo passo, que é posicionar o mini-implante no orifício criado na descorticalização.
  3. Encontrar o orifício com o mini-implante: devido à grande quantidade de mucosa móvel na região, em linha reta, a incisão criada na mucosa tende a não coincidir com o orifício na cortical, exigindo que o operador, somente pelo tato, encontre-o com a ponta do mini-implante. Vale ressaltar que, quanto mais o tecido for manipulado nesse momento, pior será o pós-operatório para o paciente e maior será o risco do mini-implante se desconectar da chave e ficar preso na mucosa (Figura 3). Logo, quanto mais amplo for o orifício, mais fácil será essa busca com a extremidade do mini-implante.
    Figura 3 – Radiografia panorâmica exibindo mini-implante preso em mucosa em região superior direita, após tentativa de instalação em processo zigomático da maxila.
  4. Parafusar o mini-implante: uma vez que a ponta do mini-implante encontra retenção no orifício da cortical, inicia-se sua inserção propriamente dita. Durante a inserção, com giro da chave no sentido horário, será necessário realizar um estiramento da mucosa alveolar local com a outra mão, para prevenir que ela enrosque nas espiras da ponta ativa do mini-implante. A inserção é executada do início ao fim, sem necessidade de mudança de eixo do mini-implante, mantendo-o desde o início o mais vertical possível (Figura 2C). Deve-se continuar a inserção até que a cabeça tenha atingido a altura planejada, respeitando os 5 mm para fora da mucosa (considerando o comprimento da cabeça, que apresenta 2,5 mm em média). A transição da mucosa para o meio bucal deve ser ocupada pelo transmucoso do mini-implante e não pela rosca, visando uma melhor estabilidade secundária14.

Planejamento tomográfico

Em relação à proximidade das raízes, apesar de se tratar de uma área mais segura que a técnica IZC propriamente dita, o processo zigomático da maxila apresenta uma maior proximidade com o seio maxilar, o que deve ser avaliado previamente, mediante exame tomográfico. A sobreinserção do mini-implante no interior do seio maxilar, em até 3 mm, parece não oferecer riscos ao paciente15-16 e, inclusive, tende a aumentar a estabilidade, em razão do posicionamento bicortical do mini-implante11,17-18. É necessário também, com base na tomografia computadorizada de feixe cônico, avaliar a presença de espessura óssea mínima de 3 mm para uma adequada estabilidade primária19.

Caso clínico

Uma paciente do sexo feminino, com 25 anos de idade, procurou tratamento ortodôntico para correção da Classe III esquelética (Figuras 4). Foi proposta uma abordagem associada à cirurgia ortognática, considerando o nível de comprometimento esquelético bimaxilar. A relação oclusal era de ½ Classe III bilateral, com mordida “de topo” anterior, exigindo um protocolo descompensatório para tornar o erro oclusal condizente com o erro facial, criando-se o famoso gap cirúrgico.

Figuras 4 – A a C. Fotografias extrabucais na fase inicial do tratamento. D a H. Intrabucais. I. Telerradiografia. J. Radiografia panorâmica.


O protocolo convencional para descompensação dos incisivos superiores, nesse caso, exigiria a extração de pré-molares superiores. Em vez disso, a proposta foi realizar a distalização do arco superior em bloco, até obter uma relação sagital dentária de Classe III completa. Para isso, foram instalados dois mini-implantes de 18 mm de comprimento e diâmetro de 2 mm (Morelli – Sorocaba, Brasil) em processo zigomático da maxila (Figura 5).

Figura 5 – Mini-implante instalado com sucesso de forma vertical em processo zigomático da maxila.


A distalização foi realizada de forma setorizada, direcionando-se forças diretamente para os molares – com cursores de distalização (sliding-jig, com magnitude de força de 200 gf), a fim de otimizar a distalização20 – e outro elástico e-link (TP Orthodontics – La Porte/IN, EUA) direto no gancho conectado ao fio na região mesial dos caninos superiores, com magnitude de força de 250 gf. Um terceiro elástico, com 100 gf, foi adaptado do mini-implante à porção posterior do sliding-jig para neutralizar o vetor extrusivo na região de molares, produzido pelo cursor (Figuras 6).

Figuras 6 – A a E. Fotografias intrabucais na fase inicial da mecânica ortodôntica descompensatória. F. As imagens tomográficas – em cortes axial e coronal – evidenciam o posicionamento dos mini-implantes.


O preparo ortocirúrgico consistiu no alinhamento, nivelamento e completa distalização do arco superior (Figuras 7), com duração de 12 meses, em dez consultas realizadas. Os mini-implantes responderam bem, mantendo a estabilidade durante toda a distalização, e foram removidos antes da cirurgia ortognática.

Figuras 7 – Fotografias ao término da descompensação ortodôntica. Note o agravamento das relações oclusais, ação necessária para possibilitar a abordagem cirúrgica. A a E. Extrabucais. F a J. Intrabucais.

Conclusão

Com um criterioso planejamento prévio à instalação, o processo zigomático da maxila é uma área extra-alveolar confiável e segura para a instalação de mini-implantes, pois permite, simultaneamente, movimentos e diversos vetores de forças.