Aceleração do movimento ortodôntico: técnica e precisão em sincronia

Aceleração do movimento ortodôntico: técnica e precisão em sincronia

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Pautado em diversos aspectos, o movimento ortodôntico precisa ser controlado e não pode ir além do ponto.

A aceleração ortodôntica é um tema que gera muito interesse dos pacientes, pois o tempo (longo) de tratamento é uma das principais queixas que o ortodontista escuta. Mas esse assunto também provoca polêmica e, muitas vezes, é mal interpretado por cirurgiões-dentistas que questionam se alguma técnica específica realmente acelera o movimento dentário.

Seria injusto e incorreto dizer que sim, que apenas um procedimento ou um dispositivo vai criar sozinho este efeito. Em Ortodontia, não existe mágica. Ao falar sobre aceleração é preciso deixar claro que existem diversos fatores que devem ser trabalhados em conjunto para que, ao final, o tempo de tratamento seja efetivamente diminuído.

Também, de nada adianta usar métodos de aceleração se não há um correto diagnóstico e planejamento, se a escolha do material e da técnica for inadequada para o caso e, principalmente, se não existe um ortodontista com sólido conhecimento envolvido e implementando a biomecânica. Por um lado, é possível diminuir o tempo de tratamento trabalhando com a ideia de criar o máximo de eficiência no sistema de forças que impulsionará os dentes para as posições finais desejadas. Neste quesito, muita evolução ocorreu e segue ocorrendo para o ortodontista chegar à força ideal aplicada no dente: desde o aprimoramento dos braquetes e fios, aos mais recentes alinhadores ortodônticos e seus softwares, há melhoras constantes que aproximam do sistema ideal.

Entretanto, sabe-se da limitação biológica, ou seja, não adianta imprimir mais força do que o periodonto pode aceitar. Muitos trabalhos mostraram que, ao ultrapassar este limiar, na verdade ocorria uma estagnação e não um movimento mais rápido. Por mais moderno e eficiente que seja o sistema do aparelho ortodôntico, esbarra-se no limite biológico.

Então, como acelerar ainda mais o movimento? Como tornar este processo mais ágil, reabsorvendo e formando osso de modo mais rápido, sem aplicar mais força? A resposta não está na maneira como movimentar o dente, mas em como manipular a resposta biológica de remodelação óssea. Já sabemos que o movimento dentário é permitido através de um estímulo (força) e uma reação (resposta biológica). O segundo é uma cascata de eventos inflamatórios em que seus marcadores, principalmente as citocinas, estão presentes e desencadeiam um processo de diferenciação celular, trazendo para a região osteoblastos e osteoclastos. Sendo assim, os métodos que propõem acelerar o movimento, na verdade, estão estimulando este processo, facilitando a remodelação e tornando os estímulos gerados pelo aparelho ortodôntico mais previsíveis e eficientes.

Existem duas categorias de aceleração: métodos cirúrgicos e métodos não cirúrgicos. Dentro delas, são encontradas várias técnicas na literatura. Aqui, serão abordadas em ordem cronológica aquelas que apresentam o melhor resultado em termos de comprovação científica e casuística clínica em níveis mundiais. 

Métodos cirúrgicos Os primeiros métodos apresentados à comunidade ortodôntica foram os cirúrgicos, também conhecidos como tratamento ortodôntico cirurgicamente facilitado, em uma tradução literal de SFOT (surgical facilitated orthodontic treatment). É interessante notar que o próprio nome não fala em aceleração, mas em facilitação do movimento. Dentro desta categoria, é possível encontrar três técnicas que compartilham o mesmo princípio biológico: corticotomia, piezoincisão e micro-osteoperfuração. Todas têm como propósito gerar um trauma na cortical óssea e no osso alveolar, criando uma ruptura dos osteócitos que, por sua vez, promoverão um processo inflamatório local, atraindo maior volume de células inflamatórias (citocinas).

Em todas, é necessário ter presente o tratamento ortodôntico em andamento, pois já existe este processo acontecendo. Ao gerar trauma, é possível aumentar o volume das células responsáveis pelo processo de remodelação óssea sem aplicar forças excessivas e ter uma taxa de movimentação mais rápida e previsível. Em todas, também é criada uma janela biológica de aproximadamente três a quatro meses.

Em termos clínicos, existem indicações específicas para estas técnicas, e a escolha inteligente vai influenciar no resultado final. A corticotomia é o método mais invasivo dos três, pois é necessário abrir um retalho para realizar os cortes nas áreas inter-radiculares (Figura 1). Entretanto, com o uso da tecnologia e a possibilidade de criar guias cirúrgicos através de tomografias, escanemanento intraoral e softwares de planejamento, o procedimento torna-se extremamente preciso, rápido e com excelente recuperação por parte dos pacientes (Figura 2). Sua maior indicação é para os casos que necessitam de movimentos ortodônticos complexos e mover os dentes para áreas fora dos limites ósseos, pois a técnica permite aproveitar a oportunidade do retalho para realizar enxerto ósseo, criando junto com a corticotomia um caminho mais seguro. O principal objetivo desta técnica é muito mais tornar possível o movimento do que propriamente acelerar o tratamento.

Para os casos em que não existe a necessidade de enxertos, a técnica de piezoincisão, criada em 2009, seria a indicação porque não precisa de retalho. Basta apenas realizar uma incisão vertical com o motor piezoelétrico na área que receberá a corticotomia. Apesar de menos invasiva, esta técnica é pouco utilizada por exigir bastante destreza do cirurgião e porque pouco tempo depois, em 2010, surgiu a micro-osteoperfuração, desenvolvida pela Propel Orthodontics (EUA) em parceria com a Universidade de Nova Iorque (NYU).

Desde seu surgimento até os dias de hoje, a micro-osteoperfuração é a mais popular e com maior casuística, principalmente por ser a menos invasiva dentre as três. Não é necessário abrir retalho, e o parafuso que realiza a perfuração tem um desenho que cria o máximo de trauma na cortical com o mínimo de profundidade. Por sua simplicidade, é mais fácil tecnicamente e com maior aplicabilidade clínica. Outra vantagem é a possibilidade de repetir o procedimento quando a janela biológica se encerra. Essa técnica pode ser indicada para praticamente todos os casos ortodônticos e proporciona uma melhora significativa do processo de remodelação óssea. Alguns trabalhos científicos mostram uma aceleração de até 62% no primeiro mês. E quando o tratamento ortodôntico é realizado com alinhadores, há diversos casos em que foi possível o protocolo de trocas a cada três, quatro ou cinco dias, sem aumentar o desconforto do paciente ou perder a adaptação das placas (Figuras 3 e 4).

 

Método não cirúrgico

A grande barreira dos métodos cirúrgicos é exatamente o fato de necessitarem de anestesia e período de recuperação. Apesar da técnica de micro-osteoperfuração ser minimamente invasiva e bem aceita em boa parte dos casos, os métodos não cirúrgicos são muito atrativos para os pacientes e os mais utilizados atualmente, principalmente em associação aos alinhadores ortodônticos.

Dentre os métodos existentes com significância científica, melhores resultados e disponíveis no Brasil está a vibração em alta frequência. É empregada em conjunto com o tratamento ortodôntico e pode aumentar o volume de células inflamatórias em até três vezes. Trata-se de um dispositivo (Figuras 5 e 6) que o paciente usa por cinco minutos ao dia durante a fase ativa do tratamento, para estimular um melhor processo de remodelação óssea, melhorar a adaptação dos alinhadores ortodônticos e reduzir o desconforto da ativação do aparelho. Outra vantagem é a possibilidade de ser utilizado na fase passiva do tratamento, durante o período de contenção, quando, na ausência do estímulo ortodôntico, vai estimular um significativo aumento da densidade óssea e melhorar a estabilidade.

Referências

1. Alikhani M. Clinical guide to accelerated orthodontics with a focus on micro-osteoperforations. Ed. Springer, 2017.

2. Al-Naoum F, Hajeer MY, Al-Jundi A. Does alveolar corticotomy accelerate orthodontic tooth movement when retracting upper canines? A split-mouth design randomized controlled trial. J Oral Maxillofac Surg 2014;72(10):1880-9.

3. Liem AML, Hoogeveen EJ, Jansma J, Ren Y. Surgically facilitated experimental movement of teeth: systematic review. Br J Oral Maxillofac Surg 2015;53(6):491-506.

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7. Alikhani M, Alansari S, Sangsuwon C, Chou MY, Alyami B, Nervina JM et al. Micro-osteoperforations: minimally invasive accelerated tooth movement. Semin Orthod 2015;21:162-9.

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